No poético cenário da Galiléia, num promontório sobre o Mar Mediterrâneo, destaca-se o Monte Carmelo, refúgio de homens santos que no Antigo Testamento ali se retiravam para rezar, pedindo a vinda do Divino Salvador. Dentre esses varões, um foi incomparável: Elias, cuja missão profética marcou a história de Israel. De si mesmo, dizia: “Estou devorado de zelo pelo Senhor Deus dos Exércitos” (1 Reis 19, 10).
Por volta do século IX a.C., viveram os hebreus um longo e terrível período de estiagem, imposta por Deus como consequência dos pecados desse povo. Rezava Santo Elias no Monte Carmelo, pedindo o fim do castigo, pelos futuros méritos do Redentor, quando viu uma nuvenzinha se aproximando. Crescendo enormemente em tamanho, ela fez-se chuva, trazendo a salvação. Segundo famosos exegetas, essa nuvem seria símbolo de Maria, a qual, com sua humildade e santidade, atrairia à Terra o Salvador do gênero humano. O Profeta Elias vislumbrou, assim, em sua contemplação, o papel d’Aquela destinada a ser a Mãe do Messias esperado, e se tornou seu primeiro devoto.
Elias é considerado pai espiritual de uma plêiade de religiosos que, dedicados à contemplação, começaram a viver como monges solitários nas encostas rochosas do Carmelo. Uma piedosa tradição diz ter essa descendência espiritual do profeta se prolongado ao longo dos séculos. Mas foi somente em 1226 que esses eremitas se institucionalizaram, quando sua regra, redigida por Santo Alberto, Bispo de Jerusalém, foi aprovada pelo Papa Onório III. Nascia a Ordem dos Irmãos da Bemaventurada Virgem Maria do Monte Carmelo.
São Simão Stock
Aumentando a perseguição maometana contra os cristãos no Oriente, os religiosos do Monte Carmelo transladaram-se para a Europa. A Ordem passou então por um período de decadência e chegou à beira do desaparecimento. Nesse momento, Nossa Senhora fez florescer no tronco ressequido uma flor esplêndida: São Simão Stock. Ermitão inglês de reconhecida virtude, havia sido eleito para o cargo de Geral da Ordem. Naquela aflitiva situação, passou a implorar ardentemente a Nossa Senhora não deixar desaparecer a família carmelitana.
Atendendo às suas súplicas, em 16 de julho de 1251, a Virgem Santíssima lhe apareceu e entregoulhe o escapulário, para ser usado por todos os carmelitas sobre as vestes, dizendo:
“Recebe, filho diletíssimo, o escapulário da tua Ordem, sinal de minha amizade fraterna, privilégio para ti e todos os carmelitas. Aqueles que morrerem revestidos deste escapulário não padecerão o fogo do Inferno. É um sinal de salvação, amparo e proteção nos perigos e aliança de paz para sempre.”
A partir desta misericordiosa intervenção da Mãe do Carmelo, a Ordem carmelitana tomou novo vigor, e dela nasceram muitas estrelas reluzentes para o firmamento da Igreja, como Santa Teresa, a Grande, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus.
Em lembrança desse feliz episódio, desde o fim do século XIV os carmelitas comemoram,
no dia 16 de julho, a Festa de Nossa Senhora do Monte Carmelo, ou do Carmo, como é conhecida no Brasil.
Privilégio sabatino
Dura séculos a controvérsia entre os estudiosos sobre a real origem do chamado “privilégio sabatino”. De qualquer modo, foi ele ratificado por vários Papas, como Clemente VII, S. Pio V e Gregório XIII, e um Decreto do Santo Ofício, de 20 de janeiro de 1613, o explica e interpreta devidamente.
Segundo tal privilégio, quem porta o escapulário com reta intenção durante a vida, conserva a castidade dentro do próprio estado e recita quotidianamente o Pequeno Ofício de Nossa Senhora, ou a oração que o substitui, definida pelo sacerdote na hora da imposição, recebe a graça da salvação eterna e será libertado do purgatório no primeiro sábado após a morte.
O escapulário ao longo dos séculos
O escapulário do Carmo era, na sua origem, um “avental” que os monges vestiam sobre o hábito para protegê-lo durante os trabalhos manuais. Com o tempo foi assumindo o significado simbólico de querer levar a cruz de cada dia. De início, era de uso exclusivo dos religiosos carmelitas. Aos poucos foi se estendendo aos benfeitores da ordem e a outros leigos atraídos pela mesma espiritualidade. Finalmente, a Igreja, como Mãe, quis estender os privilégios e benefícios espirituais desse piedoso hábito a todos os católicos, diminuindo seu tamanho e facultando a qualquer um a sua recepção.
Sinal de aliança entre Maria e os fiéis
Em pleno século XXI, quando boa parte das devoções populares são questionadas, e outras são taxadas de superstições sem base histórica, não terá o escapulário perdido seu valor, ficando reduzido a um quase amuleto, desprovido de qualquer significado mais profundo? Encontramos a resposta a essa pergunta na mensagem de São João Paulo II à Ordem do Carmo, em 25 de março de 2001. “No sinal do Escapulário”, afirma o Papa, “evidencia-se uma síntese eficaz de espiritualidade mariana, que alimenta a devoção dos fiéis, tornando-os sensíveis à presença amorosa da Virgem Mãe na sua vida. (…)
“São duas as verdades recordadas no sinal do Escapulário: por um lado, a prote
ção contínua da Virgem Santíssima, não só ao longo do caminho da vida, mas também no momento da passagem para a plenitude da glória eterna; por outro, a consciência de que a devoção a Ela não se pode limitar a orações e obséquios em sua honra em algumas circunstâncias, mas deve constituir um ‘hábito’, isto é, um ponto de referência permanente do seu comportamento cristão, tecido de oração e de vida interior, mediante a prática freqüente dos Sacramentos e o exercício concreto das obras de misericórdia espiritual e corporal. Desta forma o Escapulário torna-se sinal de ‘aliança’ e de comunhão recíproca entre Maria e os fiéis”.
“Também eu levo o escapulário em meu coração”
São João Paulo II foi sensível a esse “sinal de aliança”. No mesmo documento, é ele mesmo quem diz:
“Também eu levo no meu coração, desde há muito tempo, o Escapulário do Carmo! Pelo amor que nutro pela Mãe celeste de todos nós, cuja proteção experimento continuamente, desejo que este ano mariano ajude todos os religiosos e as religiosas do Carmelo e os piedosos fiéis que a veneram filialmente, a crescer no seu amor e a irradiar no mundo a presença desta Mulher do silêncio e da oração, invocada como Mãe da misericórdia, Mãe da esperança e da graça.”
De fato, em 13 de maio de 1981, dia do trágico atentado contra o Santo Padre, publicava o jornal La Repubblica:
“Quando o Pontífice entra na sala operatória, já se acha sem a batina branca. Pode-se ver o escapulário, dois pedacinhos de tecido de lã marrom, sobre o peito e sobre as costas, unidos por um cordão, com a estampa de Nossa Senhora do Carmo.”
AUTORA: Ir. Juliane Campos, EP
FONTE: Arautos do Evangelho (Revista Arautos do Evangelho jul 2002)
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