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Em um convento dos Menores, na Itália, tomou o hábito de noviço um virtuoso moço muito devoto de Nossa Senhora, a cujo serviço desejava muito entregar-se.

Quando ainda no mundo, ele tinha o costume de, na primavera, colher flores nos campos e jardins, das quais fazia uma coroa ou grinalda para coroar uma imagem de Nossa Senhora que tinha em seu oratório. Tendo tomado o hábito, achou-se com mais estreitas obrigações de servir a Deus, por isso se esmerava mais em exercícios espirituais, e com maiores fervores nos obséquios a Maria Santíssima, que tinha elegido por sua especial protetora.
Chegou, porém, a primavera, e não se esquecendo de sua antiga ocupação, sem pedir licença ao mestre dos noviços, saiu do convento para colher flores com que pudesse tecer a coroa para Nossa Senhora.
O mestre apanhou-o nesta ocupação, ou nesse devoto furto, e repreendeu-lhe o arrojo de sair do noviciado sem licença. O noviço ficou muito sentido, porque, tendo declarado a intenção com que colhia as flores, não lhe foi relevada a culpa, e, julgando estar no seu direito, repetiu o furto das flores, pelo que o mestre, em vista de sua indiscreta obstinação, o mortificou com aspereza.
O demônio, que tanto se desvela na perdição das almas, e principalmente daquelas que elegeram o caminho das divinas justificações, lhe arrojou no coração a sugestão de deixar o hábito, com a tentação de que no convento mal poderia esperar progresso na virtude, uma vez que lhe impediam os fervores de sua devoção.
E assim começava a duvidar de sua vocação, por não compreender que sua devoção, com aquele apego, deixava de ser virtude e passava a ser ato de sua livre vontade. Todo gênero de virtude que se inclina às exterioridades e faz pé em devoção sensível vive muito arriscado, se o não governa a prudência.
Acossado e aflito por suas imaginações, o noviço se rendeu à tentação de despir o hábito, ainda que a memória dos fervores de sua vocação lhe servisse de tormento. Antes, porém, de executar sua resolução, foi despedir-se de Maria Santíssima, visitando uma imagem sua para a qual fazia a coroa de flores. Posto de joelhos, queixou-se, com muitas lágrimas, de sua pouca sorte.
A Mãe de misericórdia, compadecida de ver caminhar para a perdição esse enganado moço, ainda que sua boa intenção e ignorância o escusassem da culpa, dignou-se de lhe falar desta forma: “Aonde caminhas, miserável? Cuidas assegurar a teu favor a minha piedade, voltando as costas a meu Filho, arrebatando assim do seu altar o sacrifício que de ti lhe tinhas feito? O obséquio que me fazias, coroando de flores a minha imagem, foi a meus olhos muito agradável, enquanto tinhas livre a tua vontade, porém, agora, porfiando nesse obséquio, faltas à obediência, portanto não pode agradar-me a tua coroa de flores, porque na Casa de Deus é mais preciosa a obediência que o sacrifício. Porém, porque o teu erro não é malicioso, senão de ignorância, não quero que voltes as costas à tua vocação, e vou ensinar-te a fazeres uma coroa, não de flores que murcham, mas de orações, que muito me agradam. E esta coroa será de muito maior estimação do que se ma ofereceras de pedras preciosas. Comporás esta coroa de sete dezenas, em que repetirás a oração com que me saudou o anjo, quando me deu a embaixada de que Deus me havia elegido para Mãe de seu Unigênito Filho. Na primeira dezena de ave-marias, com o pai nosso, meditarás o inefável gozo que teve meu coração na Conceição do Divino Verbo em minhas puríssimas entranhas; na segunda dezena reverenciarás o gozo que tive na apressada jornada que fiz pela montanha, para visitar minha prima Isabel e tirar ao abismo da culpa o seu filho, o Batista; a terceira consagrarás com fé viva às felicidades de meu parto, em que o Todo-Poderoso me enriqueceu com a felicidade de Mãe, conservando intacta a flor de minha virginal pureza; a dezena seguinte oferecerás em reverência da suma alegria que teve minha alma, vendo prostrada aos pés de meu Filho a cega gentilidade, representada por seus três Reis Magos; a quinta dezena consagrarás ao grande prazer que tive achando no templo o meu Jesus perdido, em cuja breve ausência foi imperdoável a minha dor; a sexta, ao gozo que teve minha alma na Ressurreição do meu amado Jesus, sendo eu a primeira e a mais privilegiada no gozo de suas glórias, por ter sido aquela que teve a maior parte na acerbidade de suas penas; a sétima dezena, enfim, consagrarás ao meu felicíssimo trânsito e à minha gloriosa coroação como Rainha dos Anjos e dos homens. Esta é a coroa (que me podes oferecer) do meu maior agrado, e para ti, de maior merecimento”.
Ficou o noviço cheio de confusão como de gozo. De confusão, por ser alumiado do seu passado erro com tão soberano magistério; de gozo, por ficar sabendo o modo seguro de granjear os agrados e a graça da Mãe de Deus, a que reverenciava com amor terníssimo, e, agradecido, pôs-se logo a executar a ordem que a Virgem Santa lhe havia dado.
O mestre, que zeloso o andava espiando, vendo-o ajoelhado no oratório diante de Maria Santíssima, ficou reparando nele com cuidado e viu que um anjo, a cada ave-maria que rezava o noviço, ia colhendo de sua boca uma rosa e a ia atando em um fio de ouro, que tinha nas mãos, e chegando ao pai-nosso colhia uma açucena e atava-a ao mesmo fio. Assim o esteve espiando até que o noviço acabou sua devota oração, e o anjo, formando então de todas as rosas e açucenas atadas uma formosa grinalda, colocou-a na cabeça do noviço.
Pasmado o mestre de visão tão maravilhosa, entrou no oratório e, desaparecendo a visão, ordenou ao noviço que referisse o que fazia e tudo que havia passado em seu recolhimento. Referiu ele com humildade o sucesso e pediu perdão pela rebeldia com que havia desobedecido a suas ordens.
Divulgado esse favor de Nossa Senhora, começou-se a designar aquela santa imagem com o título de da Coroa, e à sua imitação se fizeram outras imagens a que se deu o mesmo título.

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