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Sentindo-se perdido, de seu peito aflito brotou um brado de súplica à Única que poderia socorrê-lo em tal transe: “Senhora, valei-me!”

Vila típica de Portugal, Nazaré tem, tal como o país ao qual pertence, a face voltada para o mar, recebendo de frente o vento fresco e desafiador do oceano bravio. É bem conhecida a história do povo lusitano, e sabe-se que ele não costuma recuar diante desse tipo de desafio.

No distante século XII, Portugal já era nação soberana. No entanto, escaramuças e combates terrestres não deixaram de ocorrer. Além disso, os navios mouros ainda eram senhores da costa, o que constituía um grande perigo para todos. O rei Dom Afonso Henriques, preocupado em afastar essa ameaça que pesava sobre seus súditos, chamou um vassalo de sua confiança, o alcaide-mor de Porto de Mós, e o constituiu comandante das poucas naves de guerra que Portugal então possuía.

Para muitos, pareceu temeridade a flotilha cristã enfrentar os experientes marujos e corsários árabes. No entanto, a Providência velou pelos lusos, e a esquadra moura sofreu fragorosa derrota ao largo do Cabo Espichel. Era a primeira vitória da marinha portuguesa, e seu comandante, Dom Fuas Roupinho, assim entrou para a História. Porém, seu nome seria lembrado pelas gerações posteriores, não tanto pelo combate marítimo, como por ter sido objeto de um favor celeste, um verdadeiro milagre operado em nome de Maria Santíssima.

Perseguição no meio da neblina

 Tempos depois da batalha naval, Dom Fuas encontrava- se na região de Nazaré, área costeira distante pouco mais de 100 quilômetros de Lisboa, cheia de altos despenhadeiros, de onde se avista um fabuloso mar azul. Era uma manhã de setembro de 1182, e estando a região em paz, o impetuoso cavaleiro dedicava-se a uma de suas atividades prediletas: a caça. Um pesado nevoeiro cobria os campos e o litoral, e quando o caçador já estava prestes a desistir da empresa devido à falta de visibilidade, avistou o vulto de um grande cervo correndo em meio à bruma e saiu imediatamente em seu encalço.

A neblina tornava muito difícil a perseguição. Rochas e árvores surgiam, por assim dizer, do nada, e a correria avançava por terrenos desconhecidos, mas o tenaz Dom Fuas não desistia. Subitamente, o cervo deu um grande salto, e o cavalo, que vinha em seu encalço, dispunha-se a fazer igual movimento.

Nesse momento o cavaleiro percebeu, com horror, que a caça se lançara de um dos penhascos costeiros, mergulhando no abismo para perecer de encontro às rochas marinhas, e seu cavalo ia seguir atrás… Tarde demais para recuar! Em poucos segundos, o próprio perseguidor teria o mesmo trágico destino. Não havia escapatória. Sentindo-se perdido, de seu peito aflito brotou um brado de súplica à Única que poderia socorrê-lo em tal transe: “Senhora, valei-me!”

Surgiu então milagrosamente no ar, bondosa e sorridente, a Virgem Maria, com seu Divino Filho ao braço. A um ligeiro gesto seu, fincaram-se as patas traseiras do cavalo na rocha, salvando as vidas do cavaleiro e da sua montaria. De modo tão inesperado quanto surgira, a aparição se esvaiu. De joelhos no solo, e arfando de emoção, Dom Fuas Roupinho prometeu erigir nesse local uma capela em honra da Senhora de Nazaré, que o salvara. E assim o fez. O milagre marcaria tão profundamente a almas que mesmo o poeta Camões, em sua imortal obra “Os Lusíadas”, faria referência a ele.

Lembrança indelével da bondade de Maria

O pequeno oratório ficou conhecido pelo nome de Capela da Memória, e esta devoção espalhou-se rapidamente. Quase duzentos anos depois, em 1377, o rei Dom Fernando a fez ampliar e elevar à condição de matriz. A intercessão de Nossa Senhora de Nazaré, tão própria aos homens em situação de perigo e de imprevistos, tornou-se cara sobretudo aos grandes navegadores que de Portugal se lançaram à conquista dos oceanos. Homens como Vasco da Gama, ao partir em sua primeira viagem à Índia, e Pedro Álvares Cabral, na expedição que viria a descobrir o Brasil, não ousaram fazer-se ao mar sem antes ir em peregrinação à Senhora de Nazaré.

Por fim, não deixa de ter interesse o que referem alguns antigos comentaristas. No entender deles, o cervo que atraiu Dom Fuas Roupinho teria sido um demônio sob forma material. A interpretação faz sentido. Com sua operação naval, que expulsara os corsários daquelas costas, o valente cavaleiro trouxe mais paz a todos. E então o espírito maligno, inimigo da paz, tentou vingar-se dele, fazendo-o perecer no terrível despenhadeiro. Disso o livrou sua devoção à Mãe de Deus.

Até os dias de hoje a tradição aponta num dos rochedos dos Montes Pederneiras, o qual se projeta sobre o abismo, as marcas atribuídas às ferraduras do cavalo de Dom Fuas. Porém, mais do que marcar uma pedra, o milagre deixa gravado de modo indelével nos corações cristãos quão valiosa e eficaz é a devoção a tão bondosa Mãe e Senhora, Maria Santíssima.

Fonte:  Elizabeth Veronica MacDonald
Arautos do Evangelho


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