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São comovedoras as páginas em que a Irmã Lúcia recorda os últimos dias de seu primo nesta terra. Nas vésperas de morrer, Francisco lhe disse:

– Olha! Estou muito mal. Agora me falta pouco para ir para o Céu.

– Então não se esqueça lá de pedir muito pelos pecadores, pelo Santo Padre, por mim e pela Jacinta.

– Sim, vou pedir. Mas olha: é melhor pedir essas coisas à Jacinta, pois eu tenho medo de me esquecer delas quando vir Nosso Senhor! E, depois, quero antes consolá-Lo.

Dali a poucos dias, mandou chamar a prima às pressas, pois estava se sentindo pior, e queria lhe dizer algo de muito importante. Quando Lúcia chegou, pediu que a mãe e os irmãos saíssem do quarto, pois era segredo o que iam conversar. Ao ficarem sozinhos, disse-lhe:

– É que vou me confessar para comungar, e morrer depois. Queria que me dissesse se me viu fazer algum pecado, e que fosse perguntar à Jacinta se ela me viu fazer algum.

O bom pastorinho desejava lembrar-se de todas as faltas que cometera, para estar com a alma inteiramente purificada e disposta a receber a visita de Jesus Sacramentado. Lúcia lhe recordou algumas desobediências à mãe, e Jacinta, certas travessuras e um “tostão roubado ao pai, para comprar o realejo do José Marto da Casa Velha”…
Ao ouvir este recado da irmã, respondeu:

– Já confessei esses, mas vou voltar a confessá-los. Talvez seja por causa destes pecados que eu fiz que Nosso Senhor está tão triste! Mas eu, ainda que não morresse, nunca mais os tornaria a fazer. Agora eu estou arrependido. – E, elevando as mãos postas, repetiu a oração: – Ó meu Jesus! Perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno, levai as alminhas todas para o Céu, principalmente as que mais precisarem.

No dia seguinte, depois de se confessar, recebeu a Sagrada Comunhão, que o inundou de alegria! Era o momento de maior felicidade na sua vida.

– Hoje sou mais feliz do que você – dizia ele a Jacinta – , porque tenho dentro do meu peito a Jesus escondido. Eu vou para o Céu, mas lá vou pedir muito a Nosso Senhor e a Nossa Senhora que as levem também para lá depressa.

Os três pastorinhos passaram juntos todo esse dia, no quarto de Francisco. Como este já não podia rezar, pediu às meninas que recitassem o Terço por ele. Depois, disse a Lúcia:

– Com certeza, no Céu vou ter muitas saudades de você! Quem dera que Nossa Senhora a levasse também para lá em breve!

– Não vai ter, não. Imagine! Ao pé de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, que são tão bons!

– Pois é! Talvez nem me lembrarei…

Quando se fez tarde, chegou o momento de Lú­cia se despedir do pequeno companheiro de tantas e tão extraordinárias horas.

– Francisco! Adeus. Se você for para o Céu esta noite, não se esqueça lá de mim, ouviu?!

– Não a esquecerei, não. Fique descansada.

E, agarrando a mão direita da prima, apertou-a com força por um bom tempo, olhando para ela com as lágrimas nos olhos. Lúcia, também com as lágrimas a lhe correrem pelas faces, perguntou:

– Quer mais alguma coisa?

– Não! – respondeu-lhe com voz sumida.

Como a cena estava se tornando por demais comovedora, a mãe de Francisco mandou Lúcia e Jacinta saírem do quarto. Na porta, a prima se voltou uma última vez, para se despedir do pastorinho:

– Então, adeus, Francisco! Até o Céu. Adeus até o Céu!…

Quando Lúcia e Jacinta saíram do quarto, ouviram os sinos da igreja paroquial tocarem. Olha-ram uma para a outra: alguém mais morrera com a gripe espanhola, e elas se perguntavam se Francisco não seria o próximo.

Por volta das seis horas da manhã seguinte, Fran¬cisco acordou de um profundo sono. Ao seu lado já se encontrava Dona Olímpia, sua mãe, sempre a velar sobre o filho querido. Este sentou-se na cama, apontou para a porta e disse com os olhos a brilhar:

– Olhe mãe! Olhe que bela luz!

– Que luz, filho?

– Lá, perto da porta. É tão bela!

Mas Dona Olímpia nada pôde ver. Ajudou-o a recostar-se na cama e saiu do quarto, no mesmo instante em que entrava a madrinha de Francisco. Ele a cumprimentou carinhosamente, estendendo-lhe os braços e dizendo:

– De todo o coração, desejo lhe pedir perdão pelos incômodos que lhe causei, madrinha!

Ela o acariciou e lhe concedeu gentilmente o que pedia. Sentou-se ao seu lado, aconselhando-o a ficar em silêncio.

– É o único modo de se tornar forte novamente – disse-lhe.

Mas, enquanto falava, alguma coisa na face de Francisco a atraía. Havia nela tanta paz, tanta serenidade, tanta luz…

Era o dia 4 de abril de 1919. Nossa Senhora cumprira o prometido: Francisco já estava no Céu.

(Livro Jacinta e Francisco Prediletos de Maria – Monsenhor João Clá)


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