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Irmã Dulce, que ao nascer recebeu o nome de Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes, era filha do dentista Augusto Lopes Pontes e de Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes.

Aos 13 anos, depois de visitar áreas carentes, acompanhada por uma tia, ela começou a manifestar o desejo de se dedicar à vida religiosa.

Com o consentimento da família e o apoio da irmã Dulcinha, foi transformando a casa da família num centro de atendimento a pessoas necessitadas.

Em 8 de fevereiro de 1933, logo após se formar professora, Maria Rita entrou para a Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, na cidade de São Cristóvão, em Sergipe. Em 15 de agosto de 1934, aos 20 anos de idade, foi ordenada freira, recebendo o nome de Irmã Dulce, em homenagem à sua mãe.

Sua primeira missão como freira foi ensinar em um colégio mantido pela sua congregação, na Cidade Baixa, em Salvador, região onde também dava assistência às comunidades pobres e onde viria a concentrar as principais atividades das Obras Sociais Irmã Dulce.

Em 1936, ela fundou a União Operária São Francisco. No ano seguinte, junto com Frei Hildebrando Kruthaup, abriu o Círculo Operário da Bahia, mantido com a arrecadação de três cinemas que ambos haviam construído através de doações. Em maio de 1939, irmã Dulce inaugurou o Colégio Santo Antônio, voltado para os operários e seus filhos.

No mesmo ano, por necessidade, Irmã Dulce invadiu cinco casas na Ilha dos Ratos, para abrigar doentes que recolhia nas ruas. Mas foi expulsa do lugar e teve que peregrinar durante uma década, instalando os doentes em vários lugares, até transformar em albergue o galinheiro do Convento Santo Antônio, que mais tarde deu origem ao Hospital Santo Antônio, centro de um complexo médico, social e educacional que continua atendendo aos pobres.

Considerada um “Anjo bom” pelo povo baiano, recebeu também o apoio de pessoas de outros estados brasileiros e de personalidades internacionais. Mesmo com a saúde frágil, ela construiu e manteve uma das maiores e mais respeitadas instituições filantrópicas do país.

Em 1988, irmã Dulce foi indicada pelo então presidente José Sarney, com o apoio da rainha Silvia da Suécia, para o Prêmio Nobel da Paz. Oito anos antes, no dia 7 de julho de 1980, Irmã Dulce ouviu do Papa João Paulo 2o, na sua primeira visita ao país, o incentivo para prosseguir com a sua obra.

Os dois voltariam a se encontrar em 20 de outubro de 1991, na segunda visita do Papa ao Brasil, quando João Paulo 2o fez questão de ir ao Convento Santo Antônio visitar Irmã Dulce, já bastante enferma. Cinco meses depois, no dia 13 de março de 1992, Irmã Dulce morreu, pouco antes de completar 78 anos. No ano 2000 foi distinguida pelo papa João Paulo 2o com o título de Serva de Deus. O processo de beatificação de irmã Dulce está tramitando na Congregação das Causas dos Santos do Vaticano.

“ENTREVISTA COM IRMÃ DULCE”

Aproximando-se o dia da beatificação de Irmã Dulce, a cada momento cresce mais a curiosidade em torno de sua vida e obra. O que ela pensava? Como era ela? Como agia? Preparamos com muito carinho essa entrevista inédita para que você pudesse saber quais eram as cogitações, os desejos e a religiosidade do “Anjo Bom do Brasil”. Leia!

Irmã Dulce, eu gostaria de fazer uma série de perguntas. São perguntas sobre temas diversos. Inicialmente desejava saber sobre a vida de uma pessoa consagrada a Deus. Vou começar por ai…

Como devemos considerar a Vida de uma pessoa Consagrada a Deus?

Irmã Dulce – Não existe estado mais sublime do que o da pessoa que consagra sua vida a Deus. Devemos ser evangelhos vivos, uma aliança no amor mútuo, uma íntima comunhão entre a alma consagrada e Deus. A sublimidade da nossa vida está na doação total de todo ser a Deus.

É certo que a Irmã se identifica com sua ordem religiosa. Como é ser religiosa em sua congregação?

Irmã Dulce – Uma religiosa deve ser ativa, empreendedora, dar bom exemplo, estar sempre trabalhando, executando os seus deveres, a sua missão. Em tudo o que nos fizermos deve nos mover o desejo de fazer o bem às pessoas, aproximá-las de Deus. Se temos um verdadeiro amor a Deus, devemos querer que todos os nossos irmãos também o amem.

A religiosa por si mesma deve ser um exemplo. Não somos anjos nem santos, porém devemos fazer o máximo para que a nossa vida seja um exemplo.

Como assim?… Exemplo de que?

Irmã Dulce – Devemos ser evangelhos vivos.

A vida religiosa é, antes de tudo, uma aliança de amor, em íntima comunhão entre a pessoa consagrada e Deus. É necessário estarmos de coração generosamente atento ao convite que Cristo faz, independentemente de qualquer condicionamento humano.

Independente de…

Irmã Dulce – “Só Deus basta”, “Tudo é nada”, Para mim, viver é Cristo”, “Por Ele considerei tudo como lixo”, são expressões que exprimem o elevado amor que atingiram os santos em relação a Deus. Procuremos, como os santos, nos esforçar para alcançarmos a verdadeira perfeição na vida religiosa.

Toda a nossa vida deve ser em função do amor de Deus. Amemos, amemos com um amor sem limites ao nosso amado Jesus. Amemos com um amor disposto a tudo sacrificar por ele, que se sacrificou por nós. Se o amarmos assim, com um amor sem reservas, seremos felizes aqui e na eternidade.

Seremos felizes!? Por que?

Irmã Dulce – Nas coisas mais simples, nos trabalhos mais humildes, estamos fazendo o que Deus quer de nós, e isto basta. O principal objetivo é o nosso ardente desejo de amar a Deus, de servi-Lo e buscar a salvação das pessoas. Após cinquenta anos de vida religiosa, asseguro por experiência própria: não há maior felicidade neste mundo do que a de servir a Deus na pessoa do nosso irmão carente e sofredor.

A nossa vida se transforma e passamos a viver a vida e os problemas do nosso próximo, esquecendo-nos totalmente de nós mesmos.

Na verdade, não existe nada mais sublime do que ser toda de Deus. Procuremos coragem com a graça extraordinária que Deus nos concedeu através da vocação religiosa, para cumprir os nossos deveres, sobretudo a oração, a caridade fraterna, a humildade, o saber perdoar uns aos outros. E façamos o máximo para sermos bons exemplos para o nosso próximo, para aqueles com quem vivemos.

Mas isto é difícil. É uma vida de muito sacrifício.

Irmã Dulce – A nossa vida é por certo uma vida de sacrifícios, porém este sacrifício é para Deus. Quantos no mundo se sacrificam pelo amor do mundo, atrás de uma vil recompensa, ou por ambição! O nosso sacrifício é meritório. Se pensarmos bem no valor da vida religiosa, na sublimidade de nossa vocação, seremos sempre muito felizes!

Não devemos ficar parados na rotina de cada dia. Muito ao contrário, cada dia deve ser para nós um novo incentivo para melhor servirmos a Deus na pessoa dos nossos irmãos, do nosso próximo. O nosso trabalho é exaustivo: problemas diversos, inúmeras dificuldades, incompreensões. Naturalmente é um trabalho bastante difícil e exige muito de nós.

Procuramos sempre ver nos doentes a imagem de Cristo Sofredor. As irmãs se esforçam ao máximo em dedicação e cuidados aos pobres enfermos. Suas vidas são sacrificadas em prol dos doentes.

Onde encontrar forças para levar essa vida?

Irmã Dulce – A graça de Deus e a Eucaristia nos dão forças para superar todos os obstáculos e vencer as lutas do dia a dia. É na comunhão que encontramos as forças necessárias para vencer todas as dificuldades.

O que a Irmã diz me recorda a oração. Como deve ser a vida de oração?

Irmã Dulce – (Devemos procurar) fazer da nossa vida, do nosso trabalho, uma oração contínua em união perfeita com Deus. Sempre mais a vida interior, a vida de oração. A oração é a força da nossa alma. Sem ela não poderemos manter-nos firmes… Peçamos, pois, a Deus que nos conceda a graça de vivermos sempre em oração.

Oração, oração…e oração. É o que a Irmã recomendaria a suas Irmãs?

Irmã Dulce – (Sim!) Recomendo mais uma vez a oração, o espírito de caridade e fraternidade: Que todas sejam uma só oração e uma só alma. Quero (…) que atendam ao pedido de Nossa Senhora, que recomenda e pede com insistência: oração. Todo tempo disponível que tiverem, aproveitem para rezar. Também durante o trabalho, fazendo da vida uma oração contínua.

Poderia dizer algo sobre a devoção a Nossa Senhora?

Irmã Dulce – Estamos no mês do rosário (outubro). É o mês de nossa Mãe do Céu. (Sobretudo nesse mês) deveríamos nos esforçar para rezarmos com fervor o santo rosário em honra de Maria Santíssima. Todas as graças que veem do céu acontecem por intermédio da nossa querida Mãe. Então a Ela, com mais fervor, deveremos pedir a graça da perseverança, a graça de permanecermos fiéis a Deus até a morte.

Se tivermos um amor verdadeiro de filhas para com a nossa Mãe Santíssima, todos os sofrimentos, todos os problemas, tudo se resolverá mais fácil para nós.

Como considerar a devoção eucarística?

Irmã Dulce – Hoje é um grande dia para todas nós! O dia em que Jesus não querendo se separar de nós, pobres e miseráveis criaturas, resolveu ficar toda a vida conosco pela santa Eucaristia. Nunca poderemos compreender este mistério de amor de Deus para com seus filhos: na hora da santa comunhão ele se faz um conosco. Pensemos bem na nossa responsabilidade de trazer Deus conosco.

Nós, portadores de Cristo, devemos dar testemunho às pessoas de vida dedicada a Deus na pessoa do pobre. Devemos levar uma vida edificante e santa, principalmente na comunidade, na vida fraterna, na família, na qual devemos olhar as virtudes de nossos irmãos e irmãs, e não os seus defeitos.

A Irmã poderia falar do convívio numa comunidade? São anos a fio de convivência… e com pessoas muito diferentes entre si.

Irmã Dulce – Viver em comunidade não é tão fácil. Temperamentos diversos, educação diferente, instrução, formação de família. Tudo isso torna difícil a vida em comum. Porém, quanto entramos na congregação, não escolhemos com quem vamos conviver. Entramos na congregação para servir a Deus, nos santificar e ajudar as pessoas.

Eis, então, que nos deparamos com irmãs de temperamento, gênio, educação, diferentes do nosso. Nada disso, no entanto, nos deveria causar surpresa ou sofrimento. Ao contrário, na vida em comum é que vamos nos exercitar em aceitar as pessoas como são. Assim como elas nos aceitam como somos, com todos os nossos defeitos e virtudes.

É muito importante na vida religiosa a vida em comum: é uma ocasião de nos aperfeiçoarmos.

Santificar, perdoar… Ser perdoado também?

Irmã Dulce – Devemos aprimorar cada vez mais a caridade fraterna na comunidade. Não é correto que entre as irmãs que tem o mesmo ideal haja coisas pequenas, faltas mínimas, coisas sem importância que perturbem a convivência. Devemos saber perdoar aos outros como queremos ser perdoados. Procuremos seguir o exemplo de nossa Mãe do Céu que perdoou e continua perdoando as nossas faltas.

Façamos o possível para imitar o exemplo de nossa Mãe, amando, servindo, perdoando, e sabendo de tudo o que Deus nos enviar para que se faça a vontade dele e não a nossa.

… mas pode acontecer de haver ofensas pessoais!

Irmã Dulce – O mais importante na nossa vida religiosa é a união, o amor para com os nossos irmãos. Procuremos viver em união, em espírito de caridade, perdoando uns aos outros as nossas pequenas faltas e defeitos. É necessário saber desculpar para viver em paz e em união.

Jesus nos pediu que perdoássemos setenta vezes sete, quer dizer, in-fi-ni-ta-men-te… Procuremos fazer isso, além de amar e servir.

Por que as irmãs são chamadas de…

Irmã Dulce – Um instante. Vou terminar meu pensamento…

“Vede como se amam!” Assim (eu penso que) se deveria dizer das irmas! Como elas se amam, com um amor espiritual, sem ressentimento uma das outras, sabendo perdoar quando ofendidas. Jamais se deve falar mal de outra irmã. É necessário evitar a todo custo tal procedimento, Procuremos imitar o silêncio de Maria Santíssima, nossa Mãe.

Viver em paz, em harmonia, na fraternidade, na vida em comum, (como já disse) não é fácil, pois cada um tem um temperamento. Se soubermos compreender e suportar os defeitos umas das outras, assim como suportam os nossos, teremos alcançado uma grande virtude.

Obrigado. Agora… Por que as irmãs são chamadas de Filhas de Maria Servas dos Pobres?

Irmã Dulce – Que lindo e significativo título! Filhas de Maria! Filhas desta nossa Mãe tão querida. Desta Mãe a quem devemos tudo na vida, na nossa vida espiritual! Servas dos pobres! Que belo título também… Somos servas dos pobres, daqueles a quem mais Jesus ama. A serva é para servir, …mas servir amando, vendo no pobre, no carente, a imagem de Jesus.

Se pensarmos sempre assim, por mais agressivos, grosseiros, sem nenhuma formação, por piores que eles sejam, crianças ou adultos, veremos neles a imagem de Deus, a quem tanto amamos.

Por força de sua missão, a Irmã tem um contato grande com as pessoas diversas e fica sabendo de muita coisa. Então, Juventude e desagregação familiar. O que a Irmã diz disso?

Irmã Dulce – A agitação do mundo de hoje e a desagregação da família levam muitos jovens ao desespero, ao vício, à revolta. Mas devemos estar também atentos aos outros jovens, ou seja, àqueles que têm a sabedoria suave e simples dos que começam a vida, dos que são capazes de (encontrar) conforto na dor e trazer a alegria em meio ao sofrimento. Eles podem ser o espelho perfeito para os que não conseguem ver, os que parecem sem rumo, perdidos nas suas inseguranças e incertezas.

É preciso ter paciência para com os jovens. Eles têm a inquietude natural da idade, a necessidade de desvendar os profundos segredos do mundo. A nós, que já passamos pela juventude, compete prestarmos atenção, orientando-os com sabedoria. Pois são eles que, na verdade, tem de encontrar e abrir as próprias portas.

Está bem. Agora, imagine, que uma jovem não vocacionada ouça o que a Irmã acaba de dizer e peça um conselho… O que diria a ela?

Irmã Dulce – (Eu diria a ela): “na vida, o que sempre nos conforta é a Fé. E eu gostaria que essa chama de Fé ficasse sempre acesa em seu coração.

Todos nós somos fracos, sem a graça de Deus. É imprescindível procurar o apoio na graça de Deus para não “cair”. Devemos seguir certos, sempre olhando para frente, vendo ao longe aquele que nos aguarda no final da estrada da vida, com a cruz nos ombros e a luz da glória que nos espera. Siga sempre o caminho certo, mesmo que andemos lado a lado com aqueles que procuram outros caminhos. Confio em você com a sua personalidade, com sua formação(…).

Não falte a missa, reze, faça a sua comunhão. É o que vai lhe sustentar pela vida afora.”

Mais uma pergunta: Que relação a Irmã faz entre corpo, mente, alma e a interioridade da pessoa?

Irmã Dulce – O corpo é um templo sagrado e a mente, um altar. Então, devemos cuidar deles com o maior zelo. Corpo e mente são o reflexo da nossa alma, a forma como nos apresentamos ao mundo e um cartão de visitas para o nosso encontro com Deus. Habitue-se a ouvir a voz de seu coração. É através dele que Deus fala conosco e nos dá a força de que necessitamos para seguirmos em frente, vencendo os obstáculos que surgem na nossa estrada.

A Irmã acabou de dizer “Encontro com Deus”, que o homem necessita encontrar-se com Deus. Onde encontrá-lo?

Irmã Dulce – Os olhos dos que verdadeiramente veem podem facilmente encontrar a Deus. Ele sempre está naquele irmão mais necessitado, que precisa de uma mão para ampará-lo no momento de dor e de sofrimento.

Amar a Jesus é estar sempre pronto a dizer sim. É saber calar, aceitando tudo. É saber perdoar as falhas dos irmãos, como Jesus nos perdoa, é dar-se a ele na pessoa da criança, do pobre, do carente.

No meio da feiura que o mundo de hoje oferece, onde podemos encontrar a beleza?

Irmã Dulce – A beleza está nas pessoas, nas plantas, nos bichos, em todas as coisas de Deus. É mais intensa ainda nos olhos de quem consegue ver, acima da simplicidade, a beleza com que ele criou cada pequeno detalhe da vida.

Confiança em Deus… A Irmã poderia dar um exemplo do que seria essa confiança, sobretudo em tempos de incerteza?

Irmã Dulce – “Na viagem que Deus nos reservou na terra, temos que estar preparado para as possíveis incertezas do tempo. Traga sempre um agasalho para se proteger nos dias cinzentos de frio e sempre tenha no rosto um sorriso pronto a se iluminar, porque o inverno não consegue resistir ao brilho da luz do sol.

Não desanime! Coragem! As coisas de Deus são muito difíceis, mas não devemos desanimar. Nisto está o nosso mérito: sofrer, lutar e confiar na Misericórdia Divina.”

“Aqui (nas Obras Sociais) nós vemos diariamente a mão de Deus. Assistimos à repetição do milagre dos pães e dos peixes. Por isso, mesmo com todas as dificuldades, conseguimos atender a todos os que nos procuram. É preciso que tenhamos fé e esperança em um futuro melhor. O essencial é confiar em Deus.

Considero tudo o que foi conseguido até hoje como um milagre de Deus.”

É fundamental preocupar-se com uma vida espiritual levada a sério. Mas, e os bens materiais? A Irmã preocupa-se com eles?

Irmã Dulce – A preocupação com os bens materiais é natural, faz parte da vida humana. Mas o importante, o que de fato valoriza a vida, são os gestos que rendem juros e correção na conta aberta em nome de cada um de nós no banco do céu.

Os benfeitores, a quem eu nunca conseguirei agradecer plenamente, não se sintam completamente seguros: haverá ainda outras ocasiões em que bateremos às portas dos seus corações generosos para pedir ajuda.

E o amor a Jesus?

Irmã Dulce – Jesus nos ama tanto e sofreu tanto por nós, que o muito que fizermos a ele torna-se pouco diante do seu imenso amor (dele) por toda a humanidade.

(Devemos) agradecer a Deus por tudo: todos os sofrimentos, todas as alegrias, todas as graças que ele nos concedeu. Se amamos realmente a Deus, todos os sacrifícios não são nada, em vista do que ele sofreu por nós.

Acabou ficando uma dúvida… Peço que a senhora esclareça: Tanto trabalho, tanta ação não atrapalha o chamado à santidade, o chamado à vida de perfeição?

Irmã Dulce – Os trabalhos, os sofrimentos, nada disso nos deve afastar do nosso ideal de alcançar a santidade, a perfeição. “Sede perfeitas como vosso Pai do Céu é perfeito” é o que nos aconselha o Divino Mestre. Na vida comum, no dia a dia, podemos, com a graça de Deus e com a nossa aquiescência à graça, obter a perfeição.

(…) Continuo bem contente, brincando, sempre muito feliz, graças ao bom Deus! (…) espero de minha Mãe do Céu e de Jesus todas as graças necessárias para me tornar uma santa.(…) É o que desejo de coração.

O que motiva a Irmã a dar tanta atenção aos pobres e doentes?

Irmã Dulce – Muita gente acha que não devemos dar aos pobres a mesma atenção que damos às outras pessoas. Para mim o pobre, o doente, aquele que sofre, o abandonado, (todos são) a imagem de Cristo. Sempre recomendo às irmãs, aos funcionários, que vejam no doente que bate à nossa porta o próprio Jesus e, assim, façam a ele o que faríamos se Jesus em pessoa viesse nos pedir ajuda ou socorro.

Se olharmos o pobre desta maneira, então, todo o aspecto exterior, o estar sujo, cheio de parasitas, com grandes chagas, não nos incomodará, pois na sua pessoa está presente Cristo sofredor.

Pode dizer algo sobre sua obra, o Hospital, por exemplo?

Irmã Dulce – O nosso hospital é como um navio navegando sobre a tempestade, mas que tem como comandante Deus. Por isso ele segue calmo, sereno; nada o perturba.

Aqui não se diz ao doente para voltar dentro de oito dias. Aqui o doente jamais é rejeitado. Sabemos que, se fecharmos a porta, ele morre. Se não tiver lugar, a gente aperta, coloca até embaixo das camas, mas dá um jeito. A gente vê no doente apenas uma pessoa de Deus.

Quando nenhum hospital quiser aceitar algum paciente, nós o faremos. Essa é a última porta, e por isso não posso fechá-la. Não recuso ninguém, porque o doente é a imagem de Deus.

Como a Irmã faria um apelo a favor de seus pobres e doentes?

Irmã Dulce – Ajudem-me! Deem-me a possibilidade de ajudar esses pobres irmãos a saírem dos barracos cobertos de papelão ou de latas velhas: famintos, desempregados, doentes; seus filhos, suas mulheres também tem fome. E eles estão morrendo e não sabemos se estarão vivos numa manhã, quando conseguirmos aquilo que é, sem dúvida alguma, um sacrossanto objetivo.

Nossos velhinhos viviam na sarjeta, no chão. Agora tem conforto, amor e todos os cuidados que qualquer pessoa deve receber.

Permita-me dizer que a Irmã não é imortal…

Irmã Dulce – (Não sou…)

Assim sendo, pergunto o que a Irmã teria a dizer a quem a substituísse em sua obra?

Irmã Dulce – Se quem vier me substituir tiver fé, verá que Deus não faltará e que sempre conseguirá a quantia necessária para as despesas. O nosso administrador, o secretário e nosso auxiliar são testemunhas do que estou escrevendo. Quantas vezes não tínhamos nada e chegava uma pessoa com um cheque que dava para pagar todos os compromissos!

Deus é nosso organizador, o cérebro que tudo pensa e executa. Tudo que vai com Deus e com fé vai bem. Não há progresso sem Deus, não há desenvolvimento sem Deus, porque Deus é fraternidade, Deus é amor, Deus é bondade, Deus é harmonia.

A Irmã…

Irmã Dulce – Um instante… Vou terminar.

(Eu ainda diria para aquelas que me substituirão.) Espero que vocês continuem firmes no ideal de servir a Deus na pessoa do pobre, da criança e do doente. Não há nada melhor neste mundo do que se dar inteiramente a Deus. Quanto mais nos damos a deus, com os nossos sacrifícios, renúncias, vivendo não a nossa vida, mas a daqueles que nos cercam, pessoas tão carentes, mais Deus se dá a todos nós.

Imitem Jesus e os santos que viveram somente para ele. A felicidade neste mundo consiste em servir a Deus com todo o amor, com toda a dedicação. As lutas, os problemas da vida, tornam-se fáceis quando procuramos viver só para ele.

À medida que os dias se passam, sinto-me cada vez mais feliz por Deus ter me dado tão santa vocação. Jesus é tão bom! E eu, pobre criatura, não sei com que retribuir. Penso que retribuir só com o pequeno amor do meu pequenino coração, por mais amor que ele contenha, ainda é pouco para um Deus tão grande.

Peço-lhes que se esforcem o mais possível em dedicar a Jesus pequenos atos de penitência, sacrifício, oferecendo-os para a conversão dos pecadores. Jesus sofreu tanto por nós! Tudo que oferecemos a ele é pouco diante do muito que fez para a nossa salvação. Procuremos viver em união, em espírito de caridade, perdoando uns aos outros, e também as nossas pequenas faltas e defeitos.

Nota do autor:

Aqui terminamos essa entrevista inédita. Inédita porque nunca havia sido publicada em forma de entrevista. Imaginária? Não. Todo o conteúdo da matéria aqui publicada é verdadeiro. Ele foi tirado de escritos cartas, boletins, pequenas publicações editadas nas obras sociais da Irmã Dulce.

Escolhemos esse formato de entrevista porque, sendo ele lícito, é também um modo possível e simples de divulgar entre todos uma alma que também foi simples e atraente.

É necessário saber perdoar, saber desculpar, para vivermos em paz e união. Numa comunidade, só pode haver paz, se soubermos aceitar e perdoar uns aos outros.

Cronologia da vida Irmã Dulce

1914

26 de maio – Nasce Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes, à rua São José de Baixo, 36, no bairro do Barbalho, na freguesia de Santo Antônio Além do Carmo, cidade de Salvador, Bahia, Brasil. Filha do cirurgião dentista Dr. Augusto Lopes Pontes e D. Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes.

13 de dezembro – É batizada na igreja de Santo Antônio Além do Carmo.

1921

8 de junho – Morre D. Dulce, sua mãe, aos 26 anos de idade.

1922

Junto com seus irmãos Augusto e Dulce, faz a primeira comunhão, na Igreja de Santo Antônio Além do Carmo.

1927

Manifesta pela 1ª vez o interesse pela vida religiosa. Por esta época já atendia doentes no portão de sua casa, na rua da Independência, 61 – bairro de Nazaré.

1929

Conhece no Convento de Nossa Senhora do Desterro, a Irmã Rosa Schüller que pela 1ª vez lhe falou sobre a Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus.

14 de fevereiro – Foi matriculada na Escola Normal da Bahia, no 1º ano do curso de professora.

1932

20 de agosto – Recebe o sacramento da crisma, das mãos do Arcebispo D. Augusto Álvaro da Silva.

9 de dezembro – Forma-se em professora pela Escola Normal da Bahia (atual ICEIA).

1933

15 de janeiro – Faz a profissão de Terceira Franciscana, recebendo o nome de Irmã Lúcia.

9 de fevereiro – Ingressa na Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, no Convento de Nossa Senhora do Carmo, em São Cristóvão, Sergipe.

13 de agosto – Recebe o hábito das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus. Em homenagem à mãe, recebe o nome de Irmã Dulce.

1934

15 de agosto – Emite sua Santa Profissão de votos simples temporários de Noviciado.

Setembro – Vem para Salvador, trabalhar na abertura do Hospital Espanhol, em companhia das Irmãs Tabita e Capertana, exercendo as funções de enfermeira, sacristã, porteira e responsável pelo raio X.

1935

Inicia a assistência à comunidade carente, sobretudo nos Alagados, conjunto de palafitas que se consolidara na parte interna do bairro de Itapagipe, além de começar a atender os operários que eram numerosos naquele bairro, criando um posto médico que teve em Dr. Bernadino Nogueira, seu 1º colaborador e diretor. Por esta época a imprensa começa a chamá-la de Anjo dos Alagados.

Fevereiro – Passa a ensinar no Curso Infantil e lecionar Geografia e História no Colégio Santa Bernardete, no Largo da Madragoa, pertencente à sua Congregação.

Junho – Começa a trabalhar com os operários da Península Itapagipana.

6 de dezembro – Inaugura uma biblioteca para os operários da Fábrica Penha, em Itapagipe.

1936

1 de novembro – Funda com os operários Ramiro S. Mendonça, Nicanor Santana e Jorge Machado, a União Operária São Francisco, 1ª organização operária católica da Bahia.

1937

A União Operária São Francisco se transforma no Círculo Operário da Bahia.

15 de maio – A Serva de Deus inicia seu 2º noviciado.

15 de agosto – Emite sua Santa Profissão de votos simples perpétuos.

1937 / 40 – Ajuda a fundar os cinemas Plataforma, São Caetano, cuja renda contribuía para a manutenção do COB.

1939

1 de maio – Inaugura o Colégio Santo Antônio, no bairro da Massaranduba, para operários e seus filhos, com 300 crianças no turno matutino e 300 adultos à noite.

Ocorre a invasão das cinco casas, na Ilha dos Ratos, que irá definir o futuro da ação social e religiosa da Serva de Deus.

1941

8 de janeiro – Conclui o curso de Oficial de Farmácia.

A Serva de Deus inicia a obra do quilo, para ajudar as famílias carentes junto ao Círculo Operário.

1946

Dá início à campanha para entronizar o Sagrado Coração de Jesus nas fábricas de Itapagipe.

1947

11 de junho – É instalado o Convento Santo Antônio, com as Irmãs Plácida e Hilária e, a Serva de Deus como a sua 1ª Superiora, junto ao Círculo Operário da Bahia.

15 de novembro – Recebe o título de Auxiliar de Serviço Social.

1948

28 de novembro – Inaugura o Cine Teatro Roma.

1949

Ocupa o galinheiro ao lado do convento inaugurado em 1947, após a autorização da sua Superiora, com os primeiros 70 doentes, dando origem a tradição propagada a décadas pelo povo baiano, de que a Serva de Deus construiu o maior hospital da Bahia, a partir de um simples galinheiro.

1950

Inicia o atendimento aos presos da cadeia conhecida como “Coréia”, devido as más condições de higiene local, no Dendezeiros.

1952

16 de abril – Cria o SAC – Serviço de Alimentação do Comerciário – almoço a preços populares ( 2 tostões), no prédio do Círculo Operário da Bahia.

1959

26 de maio – Funda a Associação Obras Sociais Irmã Dulce.

15 de agosto – Instala oficialmente a Associação Obras Sociais Irmã Dulce.

1960

8 de fevereiro – Inaugura o Albergue Santo Antônio, com 150 leitos.

1976

25 de fevereiro – Falece seu pai, Dr. Augusto Lopes Pontes, que além de se constituir num baluarte ao lado de sua filha, na construção e consolidação das suas obras, foi um grande incentivador de outras obras sociais, destacando-se entre elas o “Abrigo Filhos do Povo”, situado no bairro da Liberdade.

1980

7 de julho – A Serva de Deus tem seu primeiro encontro com o Papa João Paulo II.

1981

9 de março – Cria a Fundação Irmã Dulce.

1983

Inaugura o novo Hospital Santo Antônio, com 400 leitos.

1984

Funda a Associação Filhas de Maria Servas dos Pobres, com o intuito de manter o carisma da sua Obra.

1988

O então Presidente da República José Sarney, indica a Serva de Deus para o Prêmio Nobel da Paz, com o apoio da Rainha Sílvia da Suécia.

1990

11 de novembro – A Serva de Deus é internada com problemas respiratórios.

1991

20 de outubro – Recebe no seu leito de enferma, a visita do Papa João Paulo II, pela última vez.

1992

13 de março – Numa sexta feira, morre às 16:45, aos 77 anos, no Convento Santo Antônio, sito a Av. Dendezeiros, depois de sofrer por 16 meses.

15 de março – As 20:00h, é sepultada no altar do Santo Cristo, na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia, na Cidade Baixa, em Salvador, Bahia, Brasil.

Fontes:

*Coleção Cinco minutos com Deus e Irmã Dulce – Luzia Sena (org) São Paulo, Paulinas, 2011
*Arautos do Evangelho
*Uol Educação
*OSID – Obras Sociais Irmã Dulce



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0 comentário

  1. gostei mas tambem é muito grande este daqui eu tenho que fazer a xeroz para escola e.m.e.f maria rita lopes pontes irmã dulce chal beijossss

  2. Como são lindas e tocantes as palavras desta santa mulher. Lendo esta bela entrevista somos convidados a viajar no tempo e a nos firmamos na fé!!

  3. meu nome eu hugo do paraguay , estive vendo por o glovo un cinema de Irmã Dulce , meu corazon isso brincadeira de felicidade eu ver que existe una persona tan rica en espiritualidade o considero que tein que ser uma santa dos pobres de todo america.

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